Como estimular a leitura em casa?

26/03/2018

 

Ler para uma criança pode diminuir a violência nas relações dentro de casa. O hábito também pode melhorar a interação familiar, o vocabulário e as ferramentas cognitivas da criança, segundo uma pesquisa realizada pelo Instituto Alfa e Beto em parceria com a Faculdade de Medicina da Universidade de Nova York (NYU), divulgada pela revista científica Pediatrics, da Academia Americana de Pediatria.

Quem conta desse estudo é o escritor Ilan Brenman, que reconheceu os mesmos benefícios dentro de sua própria casa, onde sempre procurou ler em voz alta para as suas filhas, hoje já crescidas. Ao comentar sobre esses pontos positivos, ele logo ressalta que o mais importante é que a leitura seja um ato prazeroso, tanto para o adulto quanto para a criança.

 

Ilustração Marcelo Tolentino

 

“A grande dica é ler porque vai ser um momento bacana para os dois, não só para a criança, mas também para o pai, que teve um dia corrido. A vida é dura, tem obstáculos, sofrimentos. Esse é o momento de brecar essa loucura, respirar fundo.” Tanto que, quando for escolher um livro para ler ao pequeno, a dica é optar por uma obra que também agrade o adulto, que chame a atenção “como obra literária, não como obra pedagógica”, pontua.

A literatura, aliás, é uma grande aliada para ajudar a criança a desenvolver a sua capacidade de concentração, pois convida o leitor a estar no presente da história. Tal benefício, em uma sociedade efêmera, marcada pela distração dos aparelhos eletrônicos em excesso, é um tesouro. Para o escritor, o momento da leitura é o da "solidez, do concreto da relação”.

Por isso, se a leitura do adulto tem uma vírgula mal colocada, a criança logo percebe e chama a atenção. Essa concentração pode ainda extrapolar essa dimensão e proporcionar à relação familiar certa paz, vinda do conhecimento do seu filho e do autoconhecimento propiciado pela literatura. Isso porque, na hora da história, a criança se revela. Revela suas preferências por temas, seus medos, seus anseios, suas questões.

Essa capacidade de concentração e comunicação, de autoconhecimento e conhecimento mútuo faz com que famílias tornem-se mais compreensivas, explica o escritor. Cria-se um ambiente pacífico do ponto de vista físico e turbulento do ponto de vista interno. "Porque o pacífico pode ser confundido com a paz interna, que eu acho que é ao contrário, a literatura traz uma movimentação do mundo interno que ajuda para a paz externa."

E o melhor é que não há regras para esse momento. Ele pode acontecer a qualquer hora que funcione na rotina familiar, em qualquer lugar confortável. Ilan defende que, se o pai não se sentir à vontade, não precisa criar vozes, performances teatrais. "Se ele tem essa facilidade, que bom, sorte da criança, mas, para quem não tem isso, um bom livro também resolve."

O mais importante: o adulto em contato direto com a criança deve se lembrar de que é a pessoa mais importante na vida dela, logo, será para ela o melhor contador de histórias do mundo. Com 80 anos, ela não terá como lembrança o par de tênis novos ou o tablete da última geração que ganhou, mas esses momentos de narrativa envoltos na cama, o cheiro, as conversas, o afeto.

Esse, aliás, é um diferencial da leitura em casa, já que na escola, por mais rico que seja esse momento da história, ainda se dá em um ambiente regrado. Lá, depois da história, tem aula. Em casa, depois da história, pode ter sono, abraço, beijo, jantar. A história pode ser interrompida no meio para um bate-papo ou até mesmo pelo sono que chega à criança, e isso não deve ser motivo para frustração. "Alguém dormir durante uma história é uma coisa maravilhosa, não tem coisa mais linda do mundo, pois a história é um sonho desperto. A criança estava sonhando de olho aberto, fechou os olhos e continuou o seu sonho. É uma lição de literatura."

Literatura esta cuja prática é milenar. Não deve estar atrelada a utilitarismo nem didatismo – ultrapassa essas barreiras. Serve para transmitir sabedoria, entender os valores de uma sociedade, dar uma identidade a uma grupo. Une famílias, costura afetos. Por isso, se a mãe ou o pai sentir a necessidade de buscar alguma referência quando for contar uma história, o conselho de Ilan Brenman é simples (e poderoso): rememore a sua infância. Lembre-se dos seus avós ou daquela figura mais velha que lhe contava as mais maravilhosas histórias quando criança.

Essa memória que alimentou a sua infância de histórias pode fazer o mesmo ao seu filho. "Criança precisa comer arroz, feijão, precisa se alimentar fisicamente, e precisa alimentar a alma. A história é o alimento da alma da criança. Quando falamos de história, falamos de infância."

 

 

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