Trecho do livro ABERTO ESTÁ O INFERNO

ANA FRÁGUA Todos os seus irmãos já tinham ido, menos ele. Quando falavam, contavam maravilhas. Que tinha uma lourinha, já imaginou?, uma lourinha, ali onde só havia gente de pele encardida, queimada do sol que ardia forte desde as primeiras horas do dia. Miro, o irmão mais velho, ficava dizendo que ele tinha de perder a donzelice com Ana Frágua, uma amazonense sabida que nem o cão, de olhar de mãe e cu de puta, uma fornalha entre as pernas. E naquelas brincadeiras pesadas faziam que iam apalpá-lo para ver se ele tinha ficado teso. Ficar até que ficava, mas quando pensava em Ana Frágua, aquela mulher envelhecendo, mais de quarenta anos, o coração do menino se confrangia, e se lembrava da mãe que nem conhecera. Ana Frágua vinha nos sonhos, toda nuazona, toda aberta igual à munã, porque ele já sabia de muita coisa. Também tinha os irmãos, que falavam tudo. Faltava só coragem e juntar uns trocados porque tinha de pagar fosse quanto fosse, que ela não ia fazer de graça. Depois podia ir cobrar na casa dele e aí a vergonha ia ser grande. Ia pegar uns carretos e, com o dinheiro que conseguisse ganhar, um dia ia comer Ana Frágua. Depois de um sábado bom de feira, o menino tomou coragem e foi. Fez um arrodeio medonho pra ninguém ver ele entrando direto na casa das perdidas, como diziam. Tinha sempre alguém de olho. O sol batia a pino quando ele entrou pelos fundos da casa tão acabada. Fácil, muito fácil. Foi só arrepanhar um fio de arame e entrou. Entre uma nuvem de moscas, três criancinhas sujas de terra e um porco fuçando uma lata de lavagem bem pertinho delas. Deviam ser filhos das putas. Olharam para ele tristes e remelentos, algumas costelas de fora. Ele foi entrando pelos fundos, vendo que a casa tão famosa era mais pobre que a dele, nem sentina tinha. Na dele, pelo menos tinha aquele cercadinho onde se podia cagar à vontade sem medo de ser visto. Ali era tudo no monturo mesmo. Um merdeiro sem fim que contribuía para aquele futum que cobria o lugar quando o sol ardia feio. O menino foi entrando, foi entrando e tudo deserto, as mulheres ainda deviam estar dormindo. Passou por um quarto sem porta, onde uma cortininha de contas sem brilho nem balançava, a falta de vento naquele lugar abafado. Tudo deserto. Deviam ter ido pra cidade. Diziam que tinham de fazer exames de vez em quando por causa de uma doença que matava quem pegasse. Estava olhando um quadro de santa Teresinha quando tomou o maior susto. Pela porta da frente, ela, Ana Frágua, com vestido de ir ao comércio, estampadão, cobrindo tudo, ela, a quem ele sempre via com decotes que deixavam quase escapar os peitos, num deles uma pinta escura que chamava a atenção. Ana Frágua também se assustou com ele, mas logo o reconheceu: "Você não é o irmão de Miro?". O menino balançou a cabeça, engoliu em seco e ela: "O que tá fazendo aqui a essa hora?". Ele se atrapalhou todo, não sabia o que falar e, com uma coragem que nunca pensou que fosse ter, disse: "Vim foder com a senhora". A mulher não esboçou nem riso nem raiva, não ficou com cara de ofendida, apenas passou o lenço na boca e disse: "Me espere no quartinho da frente enquanto tiro essa roupa quente". O menino foi lá pra dentro e o quarto só tinha uma cama com um lençol e uma mesinha-de-cabeceira com uns potes de creme em cima. Na parede, nenhum santo. Enquanto ela não vinha, ficou se alisando e viu que não ia passar vergonha. Ao entrar no quarto, só de japonesa, o lenço sempre na boca, disse: "Só não pode se balançar muito que hoje arranquei três dentes". Aí o menino sentiu uma pena muito grande de Ana Frágua, viu como ela estava sofrendo e assim mesmo se dispunha a fazer dele um homem. Foi tanta bondade que viu nos olhos dela que teve coragem de dizer: "É a minha primeira vez". Ana Frágua deu um riso de boca fechada e olhos murchos. Aproximou-se, o lenço sempre na boca, e sentou-se ao lado dele com muita delicadeza. Com a mão sem lenço, abaixou-lhe o calção de pano grosso com toda tranqüilidade e elogiou suas partes. "Ah, se eu não tivesse arrancado três dentes...", lamentou, rindo repuxado. O menino entendeu tudo e sentiu-se mais teso ainda. Era o que ele mais esperava, todos os homens falavam que não tinha coisa melhor, mas com três dentes arrancados ia ser impossível. Aí Ana Frágua puxou uma gaveta na mesinha e tirou um envelope que o fez ficar gelado. Quis botar uma camisinha nele, mas ele não deixou. Tinha medo de murchar, os amigos alertavam. Ana Frágua não insistiu. Antes de se deitar, ela atochou dois dedos no pote grande de creme, se untou entre as pernas e foi se derreando com muito cuidado, a cabeça imóvel. Puxou-o pra cima dela e o conduziu pela primeira vez por caminhos escuros, mas ele nunca viu tanta claridade na escuridão. Na porta, não, o creme o fez deslizar direitinho, sem nenhuma resistência. Mas, lá mais pro fundo, ela estava que nem caminho arenoso. Estava tão seca que ele teve medo de sair todo esfolado e sangrando depois de tanto socavão. Mas, aos poucos, foi sentindo uma colazinha distante e a coisa foi escorregando melhor, igual estrada que se enlameia depois da chuva. Hora nenhuma ele se esqueceu de que não podia se balançar muito, e Ana Frágua só sacudiu um pouco os quadris ao perceber que ele já vinha com toda a sua força. Soltou um leve gemido que ele suspeitou ser dos dentes arrancados. Parece que o gemido apressou nele a enorme labareda e aí ela deu uma boa recuada de corpo, empurrando-o pra fora, e ele se derramou inteiro no lençol, deixando a cama de Ana Frágua toda melada. Ficou meio envergonhado de dar trabalho a ela, que teria de lavar o lençol depois. Parecia ter saído mais do que quando ele respingava na terra seca. Ana Frágua se levantou depressa e enxugou a baba vermelha que escapulira da boca. O menino se levantou também e viu que os olhos dela acompanhavam ainda seus movimentos de corpo ao vestir o calção. Ele se achou pela primeira vez senhor da vida, e quando ela disse que ele tinha um pau muito gostoso e que ia dar muita alegria a muitas mulheres no mundo, o pescoço do menino se empertigou de vez, num orgulho tão grande que ele até se esqueceu de deixar o dinheiro e ela nem reclamou.