GOMES LEAL Sagra, sinistro, a alguns o astro baço. Seus três anéis irreversíveis são A desgraça, a amargura, a solidão... Oito luas fatais fitam do espaço. Este, poeta, Apolo em seu regaço A Saturno entregou. A plúmbea mão Lhe ergueu ao alto o aflito coração, E, erguido, o apertou, sangrando lasso. Inúteis oito luas da loucura Quando a cintura tríplice denota Solidão e desgraça e amargura! Mas da noite sem fim um rastro brota, Vestígios de maligna formosura... É a lua além de Deus, álgida e ignota. 27-1-1924 (alt./a.m.) ENIGMA No fundo de tudo quanto pensamos Há a caverna do que nós vemos Sonhos lhe bóiam na sombra aberta. Uma árvore vela-a com rede-ramos Terá de ramos luzindo pomos Pomos-estrelas na noite deserta. Por trás das costas do visto mundo Por trás de nós se sonhamos ver, Fogem de um onde ladeando estar, Ramos sem sede cruzando o fundo Do pensamento e caverna - ser Com sonhos boiando no cavernar. Quadro - boiando do fundo da alma, Com pomos luzindo na árvore-parte, Com o segredo por trás de aquém... Brilha um instante na luz sem calma Como um relâmpago de 'standarte, E em tudo isto não há ninguém. 11-2-1924