Cinco contos da Coleção 14 Pérolas
01/03/2015
>> À Procura do Mestre Perfeito, do livro As 14 Pérolas da Sabedoria Sufi
Um aluno em busca de um mestre perfeito estudou e praticou bastante todas as artes do mundo. Depois de muitos anos de procura, encontrou um homem cuja fama se estendia mundo afora. Sua sabedoria e força espiritual eram algo sobrenatural.
— Minha busca terminou — disse o aluno, dirigindo-se ao mestre.
— O senhor, sem sombra de dúvida, é o mestre perfeito que eu procurava.
— Realmente, sou o mestre perfeito — respondeu o sábio ancião.
— Por favor, aceite-me como seu aluno. Eu estudei e pratiquei todas as artes do mundo, e sei muitas coisas que ninguém sabe.
— Não posso — respondeu o mestre. — Por quê!? — surpreendeu-se o aluno.
— Porque o mestre perfeito está em busca do aluno perfeito.
>> O Espelho Humano, do livro As 14 Pérolas da Índia
Um buscador da verdade, ??homem velho e sábio, andava por uma estrada da cidade de Madras, no sul da Índia. Ao ver uma linda árvore frutífera, decidiu se sentar à sua sombra e meditar. O homem, depois de um tempo, entrou em profundo êxtase espiritual, e tudo ao seu redor passou a não significar mais nada, pois a realidade suprema estava dentro do seu ser.
Algumas horas depois, um ladrão passou ao lado do buscador da verdade, observou-o e disse:
— Este velho deve ser um ladrão, ele roubou a noite inteira e agora está cochilando. É melhor eu me afastar daqui, porque é bem provável que a polícia chegue e me leve preso junto com este homem.
Depois que o ladrão saiu correndo, um bêbado cambaleante aproximou-se do velho, parou, observou-o e disse:
— Esse aí está pior do que eu, deve ter bebido tanto que caiu no chão e adormeceu.
Logo que o bêbado foi embora, passou um jovem buscador da verdade, que, com o coração aberto, procurava o sentido da vida. Ao ver o velho sábio meditando, imediatamente parou, ajoelhou-se e beijou os pés do outro buscador da verdade.
>> O Espelho Humano, do livro As 14 Pérolas Budistas
Numa região insólita do Tibete, dois animais fizeram uma grande amizade. O búfalo, morador das planícies, e o iaque, habitante das magníficas, altas e geladas montanhas.
A relação dos dois animais era algo bonito de se observar; o carinho, o apreço e o respeito mútuo eram marcas dessa amizade. Mas nos últimos tempos havia um grave problema que ameaçava a continuidade dessa parceria.
O búfalo, quando ia visitar o iaque, dizia:
— Está cada vez mais difícil chegar até sua casa. Aqui sinto falta de ar, tontura e um cansaço que não tem fim.
Quando o iaque visitava o búfalo, dizia:
— Para mim também está cada vez mais difícil chegar até sua casa. Aqui sinto um calor insuportável, e o ar que respiro cheira muito mal.
Mas o amor fraterno entre os dois era tão intenso que eles não queriam parar de se encontrar. Porém, qual seria a solução para resolver esse impasse sem prejudicar gravemente a saúde de um e de outro?
O búfalo, que morava nas cercanias de um mosteiro, resolveu pedir ajuda para o mestre do lugar. Depois que ele contou o problema que enfrentava, o velho mestre lhe disse:
— A solução é encontrar o ponto de equilíbrio. — E o que seria isso? — perguntou o búfalo.
????? — Encontrem, você e o iaque, um terreno no meio do caminho, onde cada um poderá ceder um pouco e ao mesmo tempo preservar sua saúde.
O búfalo ficou extasiado com a solução dada pelo mestre, e saiu em disparada para compartilhar o que havia descoberto com o seu amigo iaque. A partir daquele dia, ambos passaram a se encontrar num terreno no qual podiam suportar o ar que respiravam.
Assim, aprenderam dois dos ensinamentos mais importantes do budismo: a amizade e o ponto de equilíbrio.
>> Não conte vitória antes do tempo, do livro As 14 pérolas da Mitologia Grega
A ilha grega de Samos tinha fama de produzir excelentes vinhos. A melhor plantação de uvas ficava nas terras pertencentes ao soberano da ilha: o corajoso filho de Posídon, o rei Ergino.
Ergino era tão obcecado por suas plantações e seus vinhos que acompanhava de perto todo o trabalho dos escravos. Ele não queria um único erro no processo de plantação, cultivo, colheita e fabricação do vinho. A exigência do rei era tanta que os escravos ficavam exaustos ao fim de cada dia de trabalho.
Certo fim de dia, um escravo mais próximo ao rei não aguentou e disse ao soberano:
— O senhor não viverá o bastante para provar o vinho da próxima colheita!
O rei de Samos não acreditou no que ouvira. Ele estava prestes a castigar o escravo quando um emissário chegou, esbaforido, e deixou uma carta na mão de Ergino.
Os olhos do rei brilhavam ao ler a carta e, sem nem olhar para trás, pegou o escudo, a armadura e a espada, montou no seu cavalo e saiu em disparada.
Ergino fora convocado para participar de uma das mais famosas e épicas aventuras humanas, a busca do velocino de ouro. Navegou com outros cinquenta e quatro heróis lendários sob o comando de Jasão, que queria retomar o trono do seu pai, usurpado por Pélias.
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O soberano de Samos teve um papel importante nessa aventura. Quando o timoneiro do navio dos argonautas (como eram chamados) morreu, foi ele que assumiu o comando da navegação e com muita coragem voltou da Cólquida com o velocino de ouro, laureado de triunfo e fama.
Entretanto, o que Ergino mais ansiava era o retorno ao saudoso e amado lar, pois queria rever suas plantações e suas uvas.
Assim que o rei pisou no palácio, largou a pouca bagagem que trazia e saiu correndo para ver as videiras. Ao chegar, ficou emocionado; aquele cheiro de terra e uvas maduras inebriava o corpo de Ergino.
Um dos escravos mais íntimos se aproximou e disse:
— Que bom que o senhor voltou, Majestade. O senhor quer experimentar o primeiro vinho saído da última colheita?
— Claro! É o que mais quero na vida!
O escravo deu-lhe uma taça de prata e despejou um líquido vermelho vivo nele. Porém, antes de beber, o rei se lembrou da profecia daquele outro escravo e mandou chamá-lo imediatamente.
— Quer dizer que não viverei o bastante para beber o vinho da próxima colheita?
— gritou o rei para o escravo que o havia amaldiçoado.
— Majestade, entre a taça e a sua boca ainda existe uma grande distância. O senhor ainda não bebeu o vinho — respondeu corajosamente o escravo.
Ergino ficou surpreso com a resposta do escravo, mas para pôr fim àquela bizarra conversa começou a levar a taça à boca, quando, de repente...
— Majestade, Majestade, corra! Um javali furioso está destruindo a plantação!
O soberano de Samos, ao ouvir os gritos de um dos servos, deixou a taça cair no chão, pegou uma lança e saiu em disparada para matar o animal que arruinava sua propriedade.
A luta com o javali foi feroz e o rei ficou mortalmente ferido. Antes de se esvair a última gota de vida daquele corpo, Ergino balbuciou:
“ — Entre a taça e a sua boca ainda existe uma grande distância.”?
>> Uma História Zen-Judaica, do livro As 14 Pérolas da Cultura Judaica
Um aluno de um sábio rabino de Tzfat, cidade israelense, andava reflexivo e questionador sobre a existência do Paraíso.
— Mestre, onde posso encontrar a prova da existência do Paraíso? — perguntou meio sem jeito o aluno.
O rabino acariciou a barba e respondeu:
— O senhor conhece o rabino Levi?
— Claro, todos o conhecem, é um homem santificado — respondeu
o aluno.
— Ele é a prova da existência do Paraíso — respondeu o rabino.
O aluno não esperou mais nem um minuto. Conhecia o lugar onde
tal rabino morava, era numa cidade vizinha. Depois de muito correr, o jovem chegou à casa do rabino Levi. Aquilo não podia ser o Paraíso! A casa era horrível, o aspecto do lugar era sombrio. O aluno ficou tão mal impressionado que não conseguiu nem conversar direito com o homem, logo inventou uma desculpa e retornou à sua cidade.
No dia seguinte, o aluno, bravo, disse para o mestre:
— Você me enganou! Disse que o rabino Levi morava no Paraíso! Eu fui lá e só o que vi foi um lugar espantosamente feio!
— Meu jovem — disse o rabino —, ontem você não deixou eu concluir o meu pensamento, saiu correndo como um louco. O que eu ia falar não é que o rabino Levi mora no Paraíso, mas, sim, que o Paraíso mora dentro do rabino Levi.