Por que é importante brincar com os avós?

26/06/2019


Como brincar com a vovó? O que fazer com ela num passeio ao parque? Como proceder à noite, na hora de dormir? E o que dizer quando ela estiver com saudade de casa? Essas são algumas das perguntas do livro Como ser babá da vovó, da norte-americana Jean Reagan, uma espécie de guia afetuoso de como os netos podem cuidar dos avós e criar um ambiente divertido entre as duas gerações.

Com tradução de Eduardo Brandão, o lançamento da Companhia das Letrinhas sucede a obra Como ser babá do vovô, da mesma autora. Ambas narram o cuidado com os avós em clima de amizade, entre brincadeiras, compartilhando as experiências de cada geração, assim como no trecho “sente no colo da vovó e leia alguns livros. Vire as páginas bem devagar para que ela possa apreciar as ilustrações”. Ao brincar com a inversão de papéis, a autora destaca o protagonismo infantil.

 

 

Na tese de Maria de Carvalho, estudo sobre contato intergeracional publicado pela PUC-Rio, a pesquisadora mostra a amizade como um sentimento intimamente ligado à autoestima e a outras percepções do indivíduo. Assim, num grupo com diferentes gerações, é no convívio com o outro e no reconhecimento da pluralidade que surgem noções de solidariedade, o que resulta na criação de novas imagens sobre a velhice, numa dinâmicacom em que ganham os avós e os netos.

A falta de reconhecimento entre as gerações também pode ser trabalhada com atividades intergeracionais relacionadas à dança, à música e à literatura. Ela cita a literatura infantil como um agente importante nesse contato intergeracional, ao proporcionar a interação entre as pessoas idosas e as crianças. A leitura funciona como uma ponte, estabelece “o diálogo entre as gerações envolvidas, visando uma vida saudável e com qualidade para as pessoas que estão envelhecendo”.

Na leitura de uma obra infantil, por exemplo, existe o resgate da memória dos idosos, que podem compartilhar suas ideias de infância a partir de suas vivências, experiências e habilidades. Isso melhora a autoestima do grupo da terceira idade e cria maior afetividade e solidariedade entre as gerações envolvidas, numa dinâmica que se apresenta como caminho para romper com a solidão e a marginalização das pessoas mais velhas. E se as obras são um estímulo aos avós a compartilhar suas lembranças e tradições culturais, elas são também um meio pelo qual as crianças podem transmitir valores e saberes contemporâneos.

 

 

E essa busca pelo contato intergeracional não cabe apenas ao núcleo familiar. De acordo com os resultados dessa pesquisa, a mudança demográfica causada pelo envelhecimento da população faz a gestão do cuidado do idoso sair do âmbito privado da família para a esfera pública, na qual o Estado teve que assumir como gestão pública a questão do envelhecimento.

Assim, o encontro intergeracional só enriquece os dois grupos, da infância e da velhice, a partir da troca de saberes de cada uma. “Entendemos que cada geração tem interesses próprios, decorrentes das vontades individuais e das influências políticas, econômicas, sociais e culturais, como também, podem ter interesses comuns diante de determinadas questões relacionadas à vida, à atualidade, à política; e por essa diversidade é que surge a possibilidade de transmitir e adquirir novos saberes a partir das semelhanças e diferenças de cada geração.”

 

Projetos intergeracionais

Um exemplo de projeto que fortalece a velhice por meio da cultura é o Meninas de Sinhá, grupo criado há mais de vinte anos, formado por mulheres do bairro Alto Vera Cruz, na periferia de Belo Horizonte (MG). Surgiu de encontros para resgatar o canto, a dança e as brincadeiras de mulheres idosas que sofriam de depressão. Um dos resultados desse compartilhamento de experiências, vivências, arte e brincadeira foi a melhora da autoestima e do sentimento de reconhecimento das participantes do grupo. Formado por 22 mulheres com idade entre 54 e 95 anos, o Meninas de Sinhá promove oficinas, shows e palestras motivacionais, muitas vezes levando seus brincares para lugares cheios de crianças, como creches e hospitais.

 

Apresentação do Meninas de Sinhá em Mutum, em Minas Gerais. Fotografia: Raquel Mendes


Já num contato intergeracional mais direto, outro exemplo vem da reunião de públicos de variadas faixas etárias, envolvendo o Centro para Crianças e Adolescentes, o Centro para Juventude e o Núcleo Convivência do Idoso, na cidade de São Paulo. Há mais de dez anos, os três centros atuam na realização do Encontro Cultural Intergeracional dos Serviços de Fortalecimento de Vínculos, uma mostra cultural anual com apresentações de dança, teatro e música, entre outras expressões artísticas produzidas pelos seus integrantes. Essas atividades servem como um facilitador para as relações intergeracionais, possibilitando o conhecimento de si e do outro, ampliando a convivência e o combate à intolerância, além de contribuir para a construção de uma sociedade mais inclusiva.

 

10º Encontro Cultural Intergeracional dos Serviços de Fortalecimento de Vínculos. Fotografia: Bruna Carvalho

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