
Como mediar temas difíceis com as crianças e os adolescentes?
Para Paula Desgualdo, jornalista e uma das autores do livro "A morte da lagarta", o essencial é manter a abertura e a sensibilidade para a escuta atenta da criança
Se até para os adultos, que sabem que a morte - a sua própria e dos seus - é certa, não há espaço para elaborar o luto, imagine para as crianças. Entender o que é a morte não é fácil. Lidar com ela, menos ainda. Mas na hora do adeus, a literatura pode mostrar formas mais poéticas de enxergar o luto e dar um novo significado à partida. "Pode chorar, coração, mas fique inteiro" é uma dessas histórias sensíveis sobre essa dor tão grande que é lidar com a perda de alguém querido.
(Ilustração do livro "Pode chorar coração, mas fique inteiro")
No livro, quatro crianças que experienciam a despedida iminente da avó conversam com a própria morte, que veio buscá-la. Dona morte é uma figura encapuzada, sim. Mas nada má. E a conversa com ela traz à tona os ciclos da vida, os opostos que se complementam e a certeza de que a tristeza pode doer fundo, mas não despedaça.
Como lidar com as perguntas
Para as crianças, além de ser difícil compreender conceitualmente o que é a morte em si (e o indimensionável “nunca mais” que a acompanha), a experiência do luto muitas vezes se junta à tristeza dos próprios pais, o que pode aumentar a carga de sofrimento para ambos os lados. “Até os 5 ou 6 anos, a dor da criança precisa ser verbalizada. Ela pergunta para onde a pessoa foi, se vai voltar…E o adulto tem que ficar reforçando a todo momento as coisas que ele próprio quer esquecer”, explica a psicóloga Nanda Pontual Perim.
Para ela, é importante ter um olhar sensível para as circunstâncias próprias de cada luto: se a pessoa que morreu já estava doente (e tanto a criança quanto a família tiveram mais tempo para se preparar) ou se foi uma morte súbita, quanto a criança efetivamente convivia com aquela pessoa e como era a relação entre elas. Se era alguém com quem a criança convivia pouco, um avô ou um tio que mora longe, pode ser mais difícil de entender que a pessoa realmente não vai mais voltar, porque a ausência dela não será percebida no dia a dia. Se for alguém mais próximo e de convívio intenso, a ausência tende a ser bem mais sentida.
Criança precisa se despedir?
(Ilustração do livro "Pode chorar coração, mas fique inteiro")
Isso quer dizer que o melhor é levar a criança ao velório? Não. Apenas significa que é preciso permitir que o pequeno entenda que a pessoa não vai voltar e se despeça à sua maneira. Desocupar o armário da avó que faleceu, envolvendo a criança na arrumação das roupas e objetos pessoais, pode ser um processo muito mais significativo do que ver o caixão, por exemplo.
“Eu acredito que a gente às vezes tenta proteger demais as crianças. Minha família teve muitas mortes precoces - meus avós paternos morreram quando meus pais eram crianças e eles não participaram dos velórios. Tenho muita preocupação de deixar a criança alheia à morte”, explica Nanda.
O mais importante é abrir espaço para falar sobre a morte e tudo o que ela desperta: tristeza, saudade, arrependimento. Não dá para evitar que as crianças também sintam tudo isso, portanto, não precisa se preocupar em segurar o choro ou fazer parecer que está tudo bem. Mostre ao seu filho que você está triste, explique que é porque uma pessoa querida morreu.
“O limite é tênue: não dá para despejar um balde de dor na criança, mas também não dá para poupá-la de tudo. Protegê-la demais da dor pode tirar dela a possibilidade de elaboração do luto”. E aí é que está o problema. O luto tem cinco fases, que precisam ser vividas plenamente, senão o risco (inclusive para as crianças) é ficar estacionado em uma delas.
As cinco fases do luto
(Ilustração do livro "Pode chorar coração, mas fique inteiro")
Como contar para os pequenos
Não há um jeito “certo” de explicar a morte para as crianças nem de conduzir o luto: é preciso que cada pai procure aquilo que vai deixá-lo de coração leve. Não há nada de errado em usar metáforas, por exemplo dizer que a pessoa “foi para o céu” ou “virou um anjo”, se isso fizer sentido dentro da sua cultura familiar. “Se a família usa a fantasia para lidar com o Natal, a Páscoa.. por que não recorrer a ela para falar também sobre a morte?”, argumenta a psicóloga.
Cada morte é uma, cada relação é única e cada família tem suas próprias tradições. O importante é seguir o que diz o coração e deixá-lo chorar. Inclusive na frente da criança. Uma hora ele há de ficar inteiro outra vez.
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