Ficamos e ainda estamos afastados de muitas pessoas que amamos, com quem temos afinidades e que fazem nossa vida melhor. Para as crianças, o isolamento foi ainda mais difícil e deixou marcas que continuam se fazendo sentir.
O besouro e a lagarta / borboleta compartilham a vida juntos, como bons amigos. Imagem: De repente, de Chris Naylor-Ballesteros
Um levantamento da USP, que ouviu cerca de 7 mil crianças e jovens desde o ano passado, com idades entre 5 e 17 anos, mostrou que cerca de 26% deles têm sintomas de depressão e ansiedade devidos à pandemia. Esse tema foi capa da revista Crescer de setembro e, embora a causa dessa ansiedade seja o estado de alerta em que todos vivemos nesse período, o isolamento e a falta da vida normal, de ver e encontrar os amigos ajudou a intensificar as preocupações. Em uma reportagem publicada no portal Lunetas, a psicóloga e educadora parental Denise Franco comentou que: “De um dia para o outro, a vida mudou e as crianças foram privadas do convívio com os colegas, passando a interagir através da tela do computador. Sem poder racionalizar toda essa situação, houve um aumento expressivo das crises de ansiedade e medo entre as crianças”. As relações podem ser essenciais nessa retomada - com máscara, álcool 70 e distanciamento, claro! -, para que seja mais saudável para crianças e adultos.
A importância da amizade na infância
É por isso que propomos aqui, nesta sexta-feira, algumas reflexões sobre este tema e trazemos dicas de 3 livros imperdíveis, para crianças de diversas faixas etárias, celebrando o valor de ter e conviver com um amigo. Algumas reflexões para começar a pensar sobre amizade na infância; vamos?
Os amigos nos ensinam sobre nós
Em primeiro lugar, os amigos nos ensinam muito sobre nós. Pode até parecer contraditório, mas não é: na hora da relação, quando o outro nos convida a fazer, pensar e sentir diferente do que estamos acostumados, é que conseguimos ver o que é conhecido para nós e o que não é.
Quais são nossos limites? Do que gostamos e do que não gostamos? Relacionar-se é sempre sair um pouco de si para alcançar o outro. E é nessa "jornada para fora" que conseguimos nos enxergar melhor. Os amigos costumam também nos mostrar outras formas de ser e estar no mundo, e isso é muito valioso, especialmente quando somos pequenos, porque as relações entre crianças e adultos se dá de outra forma: os pais e responsáveis têm um compromisso com ajudar e apoiar as crianças. Outras crianças, não. Nesse sentido, as relações ditas horizontais - entre faixas etárias próximas - é que permitem trocas verdadeiras e esse aprendizado sobre si e sobre o outro.
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Estar entre iguais ajuda na resolução de conflitos
Tensões e conflitos são oportunidades para aprendermos a lidar com o que nos incomoda, com nossos sentimentos, por vezes incômodos, com nossos limites e com os limites dos outros. Também são boas oportunidades para aprendermos a expressar o que sentimos e elaborar as emoções, colocando-as em palavras. Neste post, sobre relacionamento entre irmãos, a neuropsicóloga Danielle Rossini deu dicas valiosas sobre o tema que valem a leitura. https://blog.brinquebook.com.br/5-dicas-de/irmaos-sem-medo-conflito/ São justamente as relações entre pares, ou seja, entre crianças, que podem permitir esses conflitos e sua elaboração / resolução, importantíssima para a regulação emocional.
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Brincar, se divertir e voltar a confiar
O tipo de troca entre as crianças só acontece entre elas. Muito importante poder brincar junto e se divertir nesse momento delicado, percebendo com intensidade que, apesar dos medos, a vida pulsa, traz alegrias e risos e afetos. Se isso já é importante para nós, adultos, que temos muito mais recursos emocionais e até oportunidades de trabalharmos nossas questões, imagine para os pequenos! A brincadeira compartilhada, as fantasias criadas em conjunto, os sorrisos e o sentir-se querida (o) e amada (o) são importantes para o sentir-se bem e o voltar a confiar no mundo, na escola, na convivência.
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3 livros sobre amizade e infância
Para trazer esse tema tão importante direto à nossa sensibilidade, nada melhor que obras lindas e sensíveis que nos mostram exatamente isso: a lindeza e a força dos amigos. Confira nossa seleção especialíssima, com obras que foram recomendadas e resenhadas por especialistas:
1) De repente
Autor e ilustrador: Chris Naylor-Ballesteros Tradutora: Gilda de Aquino Temas: Amizade / Coragem / Transformação Faixa Etária: A partir de 2 anos (leitura compartilhada) ou 6 anos (leitura independente) O besouro tinha uma amiga. Ela chegou, de repente, e se instalou com ele no alto do rochedo. Lá, todos os dias, os dois faziam um piquenique e, ao entardecer, observavam a lua. A amiga, porém, sumiu – tão de repente como havia chegado. O besouro procurou, procurou, procurou até avistar lá do outro lado da floresta um ponto vermelho como ela. Animado, decidiu deixar a segurança do rochedo e se arriscar para procurá-la. Usando com maestria apenas o preto, o branco e o vermelho nas ilustrações, essa delicada fábula combina duas narrativas, a textual e a visual, para contar uma história de amizade com muitas nuances e camadas de leitura.
Para enriquecer a leitura:
A narrativa textual é contada em primeira pessoa, na voz do besouro, convidando o leitor a acompanhar a versão dele dos acontecimentos. O inseto acredita que a amiga sumiu, mas as imagens mostram que não é bem assim. A narrativa visual, então, conta outra história - às vezes em lindas páginas duplas sem texto, "quebrando" o ritmo das palavras e da aventura do besouro, às vezes enquanto acompanhamos o inseto procurar a amiga ou explorar a floresta.
Quem mais recomenda esse livro:
De repente foi indicado no Listãozinho -lista de recomendação de obras bacanas daquele mês para crianças- da revista especializada Quatro Cinco Um de agosto e enviado também como sugestão na newsletter Rebentos, do mesmo mês e da mesma revista (imagem abaixo). Também foi resenhado pelo especialista Marcos Losnak, da Folha de Londrina, em sua coluna de 21 de setembro.
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2) Clic e cloc
Autora/Ilustradora: Estelle Billon-Spagnol Faixa Etária: A partir de 2 anos (leitura compartilhada) ou a partir de 6 anos (leitura independente) Clic e Cloc eram amigos inseparáveis. Nunca se via Clic sem Cloc ou Cloc sem Clic. Até que, numa certa manhã, Clic acordou e não encontrou Cloc. Onde o amigo estaria? Ele sai à sua procura e não o encontra em lugar nenhum. Será que Clic ainda será Clic se não estiver com Cloc? Esta fábula divertida e delicada fala sobre identidade e descoberta de si e do outro através do afeto, das relações e das descobertas próprias e autônomas.
Para enriquecer a leitura:
Aqui, é bacana reparar nas ilustrações, a maioria preta e branca. Só os amigos são coloridos, como se a vida só ganhasse cor e alegria quando estão juntos. Repare em como a autora e ilustradora usa as cores - ou a falta delas - para ressaltar a aventura das personagens e a forma como elas estão vendo o mundo.
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3) A pequena Lana
Autora / Ilustradora: Silvana Rando Temas: Amizade / Letra bastão Faixa Etária: A partir de 2 anos (leitura compartilhada) / a partir de 6 anos (leitura independente) Inspirado em uma história real, essa obra nos apresenta Lana, uma garotinha pouco maior que uma lata de ervilha, mas que, às vezes, fica do tamanho de um gigante. Ou então pequenininha como um tatu-bolinha. Ela é boa em cuidar de seus pacientes, em fazer bolos de mentirinha e em salvar o planeta. Mas parece que sempre falta alguma coisa. Todas as noites, Lana pede um amigo, alguém que lhe faça companhia para ela não ser tão sozinha. Um dia, depois de um enorme buuuum!, a cerca vem abaixo, revelando que seu desejo estava a uma casa de distância. Com a irreverência e as cores de Silvana Rando, vamos acompanhando a amizade entre Lana e Nico. Até que... um muro surge no quintal.
Para enriquecer a leitura:
A pequena Lana tem tudo: quintal, imaginação e muita brincadeira. Mas falta alguém com quem compartilhar. E é isso que fica dessa obra divertida e afetiva de Silvana Rando. Aqui, neste post, ela conta um pouco mais o livro, a inspiração em fatos reais e a importância da amizade em sua vida. –“
Meus primeiros amigos ajudaram na minha formação como indivíduo
“–
Silvana Rando
Lana queria mesmo era um amigo. E ela conseguiu, mas de um jeito bem especial ;-) Imagem: A pequena Lana, de Silvana Rando
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E você? O que acha desse tema?