A hora e a vez das mães nas histórias adolescentes, por Keka Reis

29/07/2024

Por Keka Reis*, autora da série O dia em que a minha vida mudou..., publicada pela Seguinte

Keka Reis posa ao lado de atriz mirim de O dia em que minha vida mudou, série baseada em seus livros, que chega ao streaming

Toda vez que alguém me pergunta como foi que eu virei escritora, ou de onde veio a ideia para O dia em que a minha vida mudou por causa de um chocolate comprado nas Ilhas Maldivas – o meu primeiro livro –, eu tento inovar. Faço das tripas coração para não repetir sempre a mesma história. Não, eu não invento. Também não floreio, aumento ou exagero. Mas fato é que detesto repetir palavras e não tenho nenhuma epopeia edificante para contar sobre a minha primeira publicação. Eu era uma roteirista (e ainda sou) viciada em colocar meus projetos pessoais em editais – além disso, estava trabalhando e convivendo de perto com uma autora de infantojuvenil que sempre me inspirou. Perto o suficiente para entender que escritores não moram em um olimpo, também pagam boletos, e têm unhas encravadas. Então eu deixei de colocar a literatura em um lugar distante de mim. Vi um concurso de uma editora aberto, e a história da Mia foi aparecendo. Simples assim. Mas a verdade verdadeira é que se eu tivesse que responder à pergunta de um jeito mais resumido, eu poderia simplesmente dizer que escrevi O dia em que a minha vida mudou por causa de um chocolate comprado nas Ilhas Maldivas, porque era mãe de uma menina de onze anos de idade e estava super atrapalhada com as novidades que o crescimento dela me apresentavam: “Como é uma festa de aniversário de alguém de onze anos? Será que eu compro bixiga? Eu ainda tenho que lembrá-la de fazer algumas coisas ou deixo quieto?”. E foi com essas dúvidas na cabeça e no coração que a história de Mia, uma personagem com 11 anos, nasceu. E, com ela, a Trombeta, a mãe amorosa e atrapalhada da protagonista, que erra muito tentando acertar.

A maternidade sempre foi e sempre será um fator de extrema importância em tudo que produzo. Desde que comecei a trabalhar como roteirista – e que escreve muito para adolescentes –, eu fico extremamente incomodada com a ideia de que mães e pais destes personagens não deveriam aparecer nas séries e filmes porque essa é justamente a idade em que os adolescentes querem (e precisam) se afastar dos pais e, só por isso, não seria legal ver seus “velhos caretas” nas telas. Discordo. Também não ficava muito satisfeita com aquela caricatura recorrente de mãe chata castradora que só estava ali para atrapalhar a vida da pessoa que cresceu e agora quer se jogar no mundão. Também discordo. Não é assim!

A relação entre os filhos e as suas mães é uma das mais complexas e desafiadoras em um momento de transformação como a entrada na adolescência. E se escrevo MÃES como M maiúsculo aqui no meio do texto, é porque vivemos em um país machista em que mais de onze milhões de mulheres cuidam sozinhas dos seus próprios rebentos. Então, por que abrir mão de uma figura que tem um potencial dramático gigantesco e que pode e deve ser tratada com mais delicadeza na dramaturgia e na ficção, já que na realidade elas são quase sempre deixadas de lado? Resolvi fazer o caminho oposto. O resultado está aí, espalhado em todos os meus livros. E agora na série de TV O dia em que a minha vida mudou, com a maravilhosa atriz Maíra Azevedo – ou a Tia Ma, como é conhecida no mundo digital – e que, por sua vez, é mãe de dois na vida real e também fala bastante sobre maternidade. Estamos juntas defendendo a Trombeta, a mãe da Mia. Eu no livro, no roteiro e na criação da série, e ela na atuação, dando vida a uma personagem que eu amo e me identifico. Aliás, quer saber por que ela tem esse nome? Assista a série no Gloob (vai ter maratona dos dez episódios no dia 31 de julho de 2024 a partir das 18h30) ou veja e reveja à vontade na Globoplay!

Elenco de O dia em que a minha vida mudou, série que estreia no Gloob


*Keka Reis é escritora, roteirista e dramaturga. Começou sua carreira na MTV dos anos 1990, onde escreveu, produziu e dirigiu programas de televisão de diferentes tipos e formatos. Foi chefe de salas de roteiro para streamings como Disney e Amazon Prime e trabalhou em quatro longas-metragens para o público infantojuvenil. Dela, a Seguinte publicou a série O dia em que a minha vida mudou, adaptada para a TV pelo Gloob em 2024. Também é autora de Medley e Sozinha, este último vencedor do prêmio AELIJ (2023) e finalista do Jabuti (2023).

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