
Joaquín Camp: “O que me encanta no nonsense é a liberdade”
O autor argentino fala sobre ‘O tesouro’, seu novo livro no Brasil, os caminhos de seu processo criativo e a diversão de mergulhar no absurdo em suas criações
Em um livro ilustrado, texto e imagem não apenas caminham juntos: eles dançam. Às vezes seguem os mesmos passos, reforçando os sentidos mutuamente. Às vezes, encenam coreografias independentes, criando narrativas paralelas - que podem até se contradizer. Nesse jogo de movimentos, a mágica acontece quando uma nova narrativa emerge do intervalo que se cria entre texto e imagem. Essa nova narrativa não está só em um nem só em outro, mas em uma dimensão paralela que só ganha corpo a partir do olhar do leitor. O projeto gráfico, o design pensado para o livro, nesse caso, então, é o palco onde tudo se dá.
Uma das pessoas no Brasil que mais nos fala sobre isso e um dos pioneiros neste estudo é o autor e pesquisador Odilon Moraes. Ele é quem apresenta o novo documentário Sem Palavras, que acaba de estrear no Canal Arte1, onde ele conversa com autores de imagens sobre processos criativos e particularidades de muitos livros publicados por aqui. Para aproveitar esse momento de inspiração, selecionamos frases de 8 autores que também são ilustradores nos convidando a pensar sobre o processo de elaboração do livro ilustrado e seus sentidos. Confira:
O livro ilustrado não é mais uma novidade, mas ainda estamos vivendo os desdobramentos desse entendimento que passa não só pelo modo de compreender a escrita e a leitura de um livro, mas pelo modo de compreender a edição também. Antes, um escrevia e outro desenhava. Agora, você passa a ter um tipo de escrita que depende da interação entre ambos. Não é um ilustrador que está sendo contratado para ilustrar a obra de alguém. Ele está fazendo a obra junto. A obra tem dois autores.”
Odilon Moraes é autor de Lá Longe (Pequena Zahar, 2023), Lulu e o urso (Pequena Zahar, 2018) e Lá e aqui (Pequena Zahar, 2015) com Carolina Moreya; de Os invisíveis (Companhia das Letrinhas, 2021) com Tino Freitas e de Direitos do pequeno leitor (Companhia das Letrinhas, 2017), com Patricia Auerbach.
Eu não faço artesanato, mas preciso da artesania, daquilo que sai da ponta dos dedos; o cheiro, a cor, o ato de se sujar, o nosso trabalho é sensorial. (...) Eu escrevo também como quem ilustra. Faço montagens com as palavras, em camadas e sobreposições. Cada livro pede uma gramática visual específica.”
Marilda Castanha é autora de do premiado A quatro mãos (Companhia das Letrinhas, 2017) e em 2025 lança Meu nome (Companhia das Letrinhas, 2025), sobre a infância na Palestina. Como ilustradora, produziu O gato e o escuro (Companhia das Letrinhas, 2008), de Mia Couto, Amigos da onça (Companhia das Letrinhas, 2006), de Ernani Ssó, Contos de morte morrida (Companhia das Letrinhas, 2007) e O delírio (Companhia das Letrinhas, 2010).
Sinto que fazer livros ilustrados também tem um quê de brincadeira, e como toda boa brincadeira, é coisa séria. Para os que se interessam pelo assunto e tem vontade de produzir fica esta sugestão: caminhe com os olhos atentos, um caderninho e uma caneta. Colecione todos os fragmentos que te chamarem atenção. Alguns vão grudar com mais força e quando você menos esperar tem uma história se construindo.”
Marcelo Tolentino é autor de Domingo (Companhia das Letrinhas, 2024), Papai, ó! (Pequena Zahar, 2024) e Nem Todo (Companhia das Letrinhas, 2024).
Gosto muito dessas surpresas, desse jogo de velar e revelar. Isso aparece muito nos meus livros. Há neles a ruptura de uma lógica interna, que eu mesmo criei, e me contradigo, gerando um espanto risonho no leitor.”
Renato Moriconi é autor de Bárbaro (Companhia das Letrinhas, 2013), Uma planta muito faminta (Companhia das Letrinhas, 2021), O dia da festa (Pequena Zahar, 2017) e Estátua! (Companhia das Letrinhas, 2024).
A imagem e o texto para mim são processos completamente diferentes. Escrever para mim é como pescar: me custa encontrar as palavras exatas. Posso vir ao meu estúdio e desenhar todos os dias. Mas com o texto não acontece assim. Saio para dar um passeio. Me distraio mais. É mais incontrolável.”
Joaquín Camp é autor de O tesouro (Companhia das Letrinhas, 2025) e A gangorra (Companhia das Letrinhas, 2024).
Eu tenho me divertindo muito em tentar encontrar alternativas narrativas com as imagens, e de criar essa sequências para dominar esse território e essas linguagens do livro ilustrado. O fato de não dominá-las me faz sentir mais à vontade para percorrer todas as possibilidades. Eu gosto de falar que o livro ilustrado é uma máquina do tempo, e tentar dominar esse tempo com a ilustração com a imagem ou com a palavra.
Carol Fernandes é autora de Terra (Companhia das Letrinhas, 2024), com Yuri de Franco.
Entrei no mundo da publicidade e me encantei. (...) a linguagem da propaganda é muito próxima da linguagem do livro ilustrado, na medida em que trabalha com imagens muito fortes e frases potentes e curtas. É uma relação entre imagem e palavra muito parecida. Quando decidi escrever, o trabalho com a imagem e com o texto veio quase naturalmente.”
Patrícia Auerbach é autora da Coleção Objetos brincantes: A panela (Brinque-Book, 2023), O jornal (Brinque-Book, 2018), O lenço (Brinque-Book, 2022) e A garrafa (Brinque-Book, 2018), de Direitos do pequeno leitor (Companhia das Letrinhas, 2017) com Odilon Moraes, entre outros.
Um bom livro deixa escapar algo inesperado e mágico, uma fantasia, um fantasma. O que nos conecta com algo que pressentimos e que não podemos ver, ou sobre o que não falamos tanto. O livro toca essa dimensão sutil e potente quando deixa espaços de liberdade, sem controlar o que se deveria ler ali, como uma mensagem única, sem subestimar o leitor, porque isso é muito chato, não?”
Isol é autora de A costura (Pequena Zahar, 2023)
O autor argentino fala sobre ‘O tesouro’, seu novo livro no Brasil, os caminhos de seu processo criativo e a diversão de mergulhar no absurdo em suas criações
A autora, que fecha a série de Objetos Brincantes com o livro “A panela”, compartilha sua trajetória até a literatura infantil, inspirada pela maternidade e por seu afeto pela infância
Marilda Castanha conversa com o Blog Letrinhas sobre seus 30 anos dedicados à literatura para as infâncias