Por Luisa Geisler
Começou com Raphael Montes sugerindo que eu era um pseudônimo, me comparou à Patrícia Melo. Em uma entrevista minha para o Estado de S.Paulo, ele sugeriu que fosse Antônio Xerxenesky. Ou até mesmo Rubem Fonseca.
Na mesma matéria, Joca Reiners Terron também suspeita que eu seja o Antônio.
O crítico Eder Alex diz estar quase chutando que eu seja o J.P. Cuenca.
Ora, obrigada.
Mas confesso estar um pouco decepcionada.
Meu primeiro texto para o blog da Companhia das Letras foi sobre Stephen King, a coisa toda. Uma das crônicas mais recentes tratava de por que gosto de escrever: por gostar de ser outras pessoas. Começo a viajar na entrevista falando de literatura e identidades. A escrita de meu livro atual está tomada por um “inexplicável” atraso.
É óbvio que eu sou Isabel Moustakas.
E vocês aí culpando um pobre doutorando que nem tem tempo para manter Facebook!
Confesso (de novo) que não ia abrir o jogo logo de cara. Estava me agradando a coisa toda do pseudônimo, de ser uma pessoa misteriosa, com foto misteriosa em preto e branco. Poder dar entrevista sem os ranços que já tenho (mesmo sendo pré-adolescente), poder lidar com zero expectativas. Nem me perguntaram como é ser jovem! Mas voltaram as expectativas e o jogo ficou chato de novo.
É claro que, se eu não fosse Isabel Moustakas, esse texto seria muito conveniente para a própria. E, se eu fosse Isabel Moustakas, esse texto seria mais conveniente ainda (para mim). Ora, olhem o tom jocoso, as piscadelas subentendidas, os risinhos só com os lábios. Se eu fosse Isabel Moustakas, a última coisa que faria seria sair por aí falando que sou. Não é verdade? (Aqui entraria uma piscadela subentendida). Mas se a última coisa que eu faria seria abrir o jogo, não aliviaria todas as suspeitas eu sair dizendo que sou?
Tipo quando a sua mãe pergunta quem é que quebrou o vaso da sala (você quebrou), e você olha para o seu irmão mais novo com uma cara feia e diz:
— Ah, é, fui eu.
Sabe qual a coisa menos incriminadora que pode acontecer durante um interrogatório em uma investigação de homicídio? Você dizer que se dava mal com a vítima, ou não gostava dela. Porque uma pessoa culpada vai tentar omitir isso, vai tentar parecer que tudo estava perfeito (aqui se nota a menção ao direito, formação de Isabel, e mais uma piscadela).
Então sou Isabel. E não sou também.
Se eu não soubesse que sou eu (e eu sei), eu chutaria a Elvira Vigna. Até porque é sabido como pago-pau pra Elvira e, no livro, tentei emular em parte o estilo dela. Mas se não fosse minha emulação, talvez fosse a Elvira original.
Não sei por quê, desejo que seja o Sérgio Sant’anna. Ou alguém inesperado para o gênero, tipo a Carol Bensimon. Depois dos problemas que a realidade tem com a autoficção do Ricardo Lísias, ele próprio seria uma escolha plausível, não? Um começo fresco, um nome que não pode ser processado por bobagem.
Ou o próprio felino do Antônio Xerxenesky, por quem ele jura na minha entrevista.
Acima de tudo, acho que Raphael Montes é Isabel. Como quando a J.K. Rowling criou Robert Galbraith. Montes, traduzido e bem vendido em trocentos idiomas, quis se desafiar um pouco. Já publica na Companhia das Letras, quis saber opiniões além das dos fãs de carteirinha. Saindo do carioca carismático rei das redes sociais, entra uma persona mais séria, mais contida (até textualmente), mais reservada: Isabel. E o próprio Raphael seguiu o meu plano original. Disse que leu o livro de Isabel, ainda fazendo críticas à autora, apesar de incluir uns elogios cá e lá, incitando curiosidade de leitores. Um gênio.
Mas isso tudo se eu não fosse Isabel Moustakas. E eu sou Isabel Moustakas. Podem enviar perguntas nos comentários, no Facebook, onde quiserem. Me desafiem, se quiserem. Isto é, se ninguém mais ousar se assumir como Isabel.
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Luisa Geisler nasceu em Canoas (RS) em 1991. Publicou Contos de mentira (finalista do Jabuti, vencedor do Prêmio SESC de Literatura), Quiçá (finalista do Prêmio Jabuti, do Prêmio São Paulo de Literatura e do Prêmio Machado de Assis, vencedor do Prêmio SESC de Literatura). Seu último livro, Luzes de emergência se acenderão automaticamente, foi publicado pela Alfaguara em 2014. Tem textos publicados da Argentina ao Japão (pelo Atlântico) e acha essa imagem simpática.