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Então. Eu terminei um livro. Acabei de enviá-lo pra Editora Seguinte, o selo jovem da Companhia das Letras. Ele chama Enfim, capivaras e esse provavelmente vai ser o título. Ele provavelmente sai esse ano. Sim, ele foi escrito bem rápido. Vou responder as perguntas que mais tenho recebido nas redes sociais (Instagram e Twitter, principalmente), mas podem seguir perguntando que respondo por lá.
1. Qual a sinopse?
Um grupo de jovens adolescentes se irrita com um amigo mentiroso compulsivo que dizia que tinha uma capivara e decide ir visitar a capivara. A capivara não está na casa do mentiroso, pois “fugiu”. Cada um dos protagonistas, com motivações próprias, decide que dessa vez não vai passar em branco e querem pagar pra ver. Querem pegar o mentiroso no ato. O livro se passa entre 18h e 6h em que procuram, talvez resgatem, talvez roubem, o bicho. Ao longo disso, cada personagem vai revelando sua motivação pra estar ali, os danos que mentiras foram causando nas vidas deles, como uns também mentiram para e sobre os outros. Uma das personagens talvez esteja se descobrindo assexual, outra é fóbica social, outro vem de uma longa linhagem de fazendeiros cheio de expectativas. Ah, o livro se passa numa cidade pequena numa chapada do interior mineiro. E tem carro de som que anunciam o horário do cinema, o jingle da fruteira e os obituários. Como o livro tem personagens adolescentes e uma história adolescente, ele entra pro rótulo de young adult, e vai sair pela Editora Seguinte, acho que este ano ainda.
2. Vai ter sessão de autógrafo com capivaras?
Creio que não. Não seria ambientalmente responsável
3. O que é um livro young adult?
Estou com poucos caracteres, então olha a Wikipédia aqui. É literatura pra jovens, mas mais legal, em resumo.
4. Por que você optou por escrever um young adult?
Quando um autor começa um livro, o projeto de um livro, ele toma algumas decisões. Vai ser um livro sobre o tema X, com protagonistas Y, com extensão de tempo W e por aí vai. A maioria dos autores de prosa, antes mesmo de decidir isso, precisa decidir algo bem simples: vai ser, entre outras opções, um livro de contos ou um romance? Se o autor escreve poesia e prosa, ele precisa decidir se vai ser, entre outras opções, um conjunto de poemas, um único poema épico, um conjunto de contos ou um romance? É claro que dá pra desconstruir tudo isso, e é esse o ponto. Ao decidir escrever uma narrativa mais longa, isso acaba resultando no rótulo de “romance”. Ao definir que seria um livro com adolescentes como protagonistas (e, portanto, mais voltado pra adolescentes leitores), isso acabou indo pro rótulo de “young adult”. Mas isso não quer dizer que um romance não possa ter contos dentro, ou um romance não possa ter poemas. Pra mim, por exemplo, eu não sei direito se o De espaços abandonados é um romance stricto senso. Ele sai muito da norma, vários trechos foram pensados como contos isolados, com começo meio e fim. Tem poemas no meio do Luzes de emergência se acenderão automaticamente. E não fiquei tentando justificar isso com uma crítica literária extensa. A opção de gênero me ajuda a pensar a história, mas não é um cercadinho que me proíbe de fazer outras coisas. Com young adult, a mesma coisa. Calhou que caiu nos rótulos de “romance”, “linear”, “young adult”. É um rótulo, entende? Não tanto uma opção. O livro existiria de qualquer forma.
5. Você escolheu pelo dinheiro?
Gente, literatura brasileira não dá muito dinheiro.
6. Você escreveu pela linguagem mais simples? O livro vai ser mais fácil, mais mastigadinho?
Este não é o foco do texto. Talvez eu precise fazer um post novo se quiser argumentar só sobre isso. Mas em resumo: acho essa forma de pensar argumenta e conceitualmente débil. Fracas mesmo. A única explicação que tenho é: qualquer um que pensa que um livro pra jovem vai ser necessariamente mais fácil ou mais “explicado” provavelmente precisa se auto-afirmar muito como leitor “adultão”. Não é assim que funciona um livro, não é assim que funciona a escrita, não é assim que funciona um leitor. Talvez na escola, num sistema que veja a educação com objetivos mensuráveis, com o (dogmático) conceito de “progresso” definido, sim. Mas não é assim que existe a literatura. Eu como leitora quando adolescente — lendo tudo no meio de entre Edgar Allan Poe, Stephen King e Guimarães Rosa — era uma leitora com uma carga literária muito maior do que muitos adultos com quem interajo hoje. Essa dicotomia difícil-fácil adulto-adolescente não existe. Eu escrevi meu primeiro livro (pra “adultos”, que ganhou Prêmio SESC de Literatura, que foi finalista do Jabuti) aos 19 anos. Pra muitas categorias comerciais, ainda seria considerada até leitora de young adult. Como poderia uma pessoa “subleitora” concorrer com “autores adultos” no Jabuti? Onde fica a divisão entre leitura fácil e difícil? O que é um livro fácil ou difícil? Quem é o leitor ideal? São conceitos idiotas que não me servem como autora. Eu só quero escrever, e calhou que um livro que escrevi caía numa categoria diferente.
7. Vai ter capivaras no livro?
Sim, tem uma capivara, chamada Capi. Ela aparece ao longo do livro a partir da metade. Tecnicamente, tem mais de uma, em dados momentos.
8. Você ainda vai escrever livros pra adulto?
Vou escrever os projetos que me vierem à cabeça. Muitos são pensados como “ficção literária” (argh), e vou escrevê-los. Mas todo mundo pode ler, não é “pra adulto” ou “pra adolescente”. Estou me repetindo.
9. Vai vir capivara de brinde?
Pergunta lá na Editora Seguinte.
10. Você já está escrevendo o próximo livro?
Sim e não.
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Luisa Geisler nasceu em Canoas (RS) em 1991. Publicou Contos de mentira (finalista do Jabuti, vencedor do Prêmio SESC de Literatura), Quiçá (finalista do Prêmio Jabuti, do Prêmio São Paulo de Literatura e do Prêmio Machado de Assis, vencedor do Prêmio SESC de Literatura). Seu último livro, De espaços abandonados foi publicado pela Alfaguara em 2018. Tem textos publicados da Argentina ao Japão (pelo Atlântico) e acha essa imagem simpática.