Estariam as crianças urbanas condenadas ao confinamento? Em tempos de escolas cimentadas e gradeadas, o desemparedamento da infância virou tema de debate no Sesc Interlagos, em São Paulo, durante o Seminário Latino-americano Criança e Natureza, entre os dias 6 e 7 de junho, logo após o Dia Mundial do Meio Ambiente (5/6). O evento trata de como as escolas, as cidades e os espaços públicos podem favorecer o encontro da infância e do ambiente.
No encontro, uma mesa de destaque tem a presença da brasileira Beatriz Goulart, diretora do centro de pesquisas e projetos do Cenários Pedagógicos e do Projeto âncora, e da chilena Ângela Ibañez, que conta a sua experiência na Fundación Patio Vivo, em que transforma parquinhos em uma ferramentas pedagógicas, as “paisagens de aprendizagem”. Ali, serão debatidas as confluências entre educação, natureza e território.
O tema também protagoniza a publicação recente do Instituto Alana, “Desemparedamento da infância”, organizada pela pesquisadora Maria Isabel Amando de Barros. Ela explica que um dos principais conceitos a serem abordados é a questão dos “territórios educativos”, quando “as escolas estabelecem parcerias, estabelecem relações com organizações fora dos seus muros, sejam elas uma praça, um parque, uma outra organização, e ampliam, então, o universo de atuação da comunidade escolar como um todo”.
Essa experiência de ressignificar o ambiente do entorno da escola atinge toda uma comunidade e extrapola os muros escolares. Chega aos educadores, pais, familiares e aos moradores da cidade, como explica Maria Isabel. “Quando conseguimos ocupar um parque que fica ocioso durante a semana com atividades de uma escola é muito valioso. Aquele espaço ganha um nova vida, ganha valor, ganha mais uso, ganha mais apreciação pela comunidade.”
O que não significa que iniciativas como essa não sofram resistência, em especial de alguns pais e familiares que carregam como preocupação a segurança das crianças. Talvez seja por essa mentalidade sobre os espaços urbanos contemporâneos que os pequenos tenham mudado os seus hábitos de brincar nas últimas décadas. Se antes passavam as manhãs na escola e as tardes pelas ruas, a brincar dos mais diversos jogos, agora a escola é em tempo integral, muitas vezes com aulas que duram todo o dia.
“A educação integral não pressupõe que as crianças fiquem na escola o tempo todo, de manhã tendo aula e no período do contraturno tendo mais aula. Ela aposta nesse modelo de comunidade educadora”, explica Maria Isabel, questionada sobre o caráter isolado das iniciativas que perseguem essa ideia. “Essa é uma política pública que está aí para subsidiar esse movimento que acreditamos como muito potente na aproximação da criança com a natureza.”
Ela defende que a mudança deve acontecer mais no olhar dos envolvidos que nos próprios espaços educativos, usualmente cimentados e gradeados. São três as dimensões em que esse olhar pode mudar: espaço, tempo e rotina. Espaço, porque há de se pensar em maneiras de revitalizar esses ambientes cimentados, utilizar elementos naturais, em uma organização que proporcione encontros, o livre brincar, o movimento, a introspecção. Tempo porque a escola ocupa hoje esse lugar privilegiado em que as crianças passam dias inteiros, onde vivem grande parte de suas infâncias e de suas questões. Rotina porque essa é a combinação entre os dois anteriores e é o que está imposto na experiência escolar hoje. Assim, não são necessários novos espaços, mas novos olhares, novas mentalidades, novas ideias.
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Anote na agenda
Seminário Latino-Americano Criança e Natureza 2018
Onde: Sesc Interlagos (av. Manuel Alves Soares, 1.100, Parque Colonial, São Paulo)
Quando: dias 6 e 7/6
Quanto: grátis