Mudam as gerações, mas o gosto por aquelas histórias que fazem com que os leitores se sintam verdadeiros investigadores permanece. Desde os clássicos da Coleção Vaga-Lume a partir dos anos 1970 (quem lembra?) até os lançamentos mais recentes, como Os detetives do prédio azul - Casos ecológicos, de Flávia Lins e Silva (Pequena Zahar) e Além do desafio, escrito por Severino Rodrigues e ilustrado por Daniel Almeida (Escarlate), os títulos, que estão dentro do gênero de romance policial, continuam fazendo sucesso entre o público infantojuvenil.
Como explicar esse fascínio?
A narrativa nos romances policiais costuma girar em torno de uma investigação. Um crime foi cometido, um mistério deve ser desvendado e o leitor, que também fará papel de detetive, acompanha os personagens na busca de pistas para solucionar a questão. Em Os detetives do prédio azul - Casos ecológicos, por exemplo, a turma, formada por Flor, Zeca e Max, se junta para esclarecer enigmas que envolvem plantas e animais. Em Além do desafio, um adolescente participa de um desafio, desses que viraram moda nas redes sociais, mas se machuca feio e vai parar no hospital. Três de seus amigos se juntam para tentar descobrir o que aconteceu, em uma trama policial intrigante, que leva o leitor a participar da investigação e se sentir parte do time.
É um dos gêneros favoritos do público infantil e juvenil e, dentro dele, é possível encontrar histórias variadas, que exploram, à sua maneira, a curiosidade, o medo, o espanto, a inquietação, enfim: os sentimentos despertados em nós quando há um mistério que precisa ser solucionado. “As crianças e jovens amam mistérios e enigmas, porque se envolvem com a história, ficam ‘presos’ até conseguirem descobrir quem é o culpado e, depois, querem confirmar se estavam certos”, explica a professora de literatura Vanessa Ratton, da Escola Teia Multicultural, em São Paulo (SP). Ela também é escritora infanto-juvenil e diretora da Associação dos Escritores e Ilustradores de Literatura Infantil e Juvenil (AEILIJ).
Essas narrativas desenvolvem a criatividade, a imaginação e o raciocínio lógico. Esse tipo de trama gera muita adrenalina para o leitor e, por isso, é viciante. Ficamos intrigados e nos sentimos recompensados quando descobrimos o culpado antes do final (Vanessa Ratton).
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O encanto por esse tipo de história também pode estar ligado à idade e à fase da vida, já que a passagem do final da primeira infância para o início e até meados da adolescência é um período turbulento. São muitas experiências, questionamentos e aprendizados. Nesse meio do caminho, entre ser criança e ser adulto, os jovens tentam construir uma individualidade, procuram entender o mundo que os cerca, além dos próprios anseios. De certa forma, os livros de detetives e mistérios ajudam a traduzir essa busca incessante por respostas e ajudam a compreender a sociedade em que estão inseridos. São histórias que exploram os pares opostos, como o bem e o mal, o certo e o errado, o vilão do crime e o detetive que o investiga. Direta ou indiretamente, os livros propõem questionamentos éticos, ideológicos e identitários, que dialogam com o processo pelo qual eles estão passando.
A história dos livros de romance policial e detetive
De acordo com a professora doutora Maria José Palo Gordo, especialista em literatura infantil, da Pontifícia Universidade Católica (PUC-SP), o surgimento do gênero aconteceu no fim do século 19, justamente entre a literatura que fazia a conexão da infância com a adolescência, dentro da pedagogia racionalista, que valoriza a condução do pensamento de maneira metódica, em busca de critérios para estabelecer algo como verdadeiro. É justamente o que fazem as narrativas de livros de mistério.
“Nos meados do século 19, a fantasia começa a ser afastada do espaço central da literatura infantil e juvenil pela pedagogia racionalista, por correntes realistas e pela dificuldade de ser aceita pelo novo público adolescente, que já recebia aos poucos a produção contemporânea. Aqui, a fantasia vem associada a outros modelos literários, dentre eles, o modelo de mistérios, obras detetivescas”, explica a professora da PUC. “O interesse pelo oculto e pelo sobrenatural presente na literatura de adultos, transferiu-se para a literatura infantil e juvenil fundindo as histórias clássicas de fantasmas com o modelo de mistérios a serem descobertos”, diz ela.
“As numerosas séries de Enid Blyton, mundialmente famosas, e suas personagens no universo dos mistérios difundiram a narrativa policial de protagonismo infantil, iniciado por Erich Kaestner com Emílio e os detetives, em 1928. Tratava-se de uma literatura da pedagogia racionalista sob valores que impediam a repetição dos horrores das guerras mundiais”, detalha Maria José.
O gênero literário no Brasil
Aqui no Brasil, mais adiante, a coleção Vagalume é um exemplo clássico, que fez muito sucesso entre gerações anteriores, sobretudo entre as décadas de 1970 e 1990. Os livros de Carlos Marinho, Lúcia Machado de Almeida e Maria José Dupré eram alguns dos preferidos. Outra coleção famosa era Os Karas, de Pedro Bandeira, com títulos como A droga da obediência e Droga de americana!. Dá para citar também O gênio do crime, da série As aventuras da Turma do Gordo, de João Carlos Marinho e O caso da estranha fotografia, de Stella Carr. “A coleção Salve-se quem puder, traduzida para o português, foi um grande sucesso também”, aponta Vanessa, professora da Teia.
“A literatura policial divide com a literatura infantil algumas características. Com a inclusão de seus clássicos como Arthur Conan Doyle, Agatha Christie etc. na literatura juvenil, com características mais semelhantes à literatura infantil, houve a combinação de modelos literários, que permitiu a existência do gênero policial”, comenta a professora Maria José, da PUC- SP. “Uma das linhas pressupõe um mistério a ser resolvido como um problema lógico. Como um jogo dedutivo, um detetive externo segue o caso. É a investigação-descoberta por meio de pistas”, exemplifica.
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A professora da Teia, Vanessa, ressalta ainda que, dentro do gênero de romance policial, há vários subgêneros. Os livros de mistério e detetive podem ter vários estilos. “Os principais são: Romance de Mistério, de Enigma, que é quando o crime ocorre em um local fechado e o culpado está presente na cena durante a investigação; Romance Noir, em que o caso é resolvido pela polícia e tem características muito realistas; os de Espionagem e de Suspense, que é quando o leitor tem mais informações que o protagonista e resta saber se o culpado vai se safar ou não”, resume. Dá para escolher tipos diferentes e devorar um de cada vez. O perigo é não conseguir largar até resolver o crime.
Como escolher um bom livro de detetive para crianças ou pré-adolescentes?
Como já ficou claro, boas opções de livros de mistério não faltam. Mas como acertar na escolha? Primeiro, é importante considerar a idade, para pensar no tipo mais adequado de narrativa e até no tamanho e na complexidade da história. Acima de tudo, porém, um bom livro de mistério, detetive ou suspense deve contar com um elemento importante: a verossimilhança.
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Para que a história prenda e seja empolgante, é fundamental que, ao longo da narrativa, o leitor encontre pistas verdadeiras e falsas, possa ouvir e analisar o discurso dos personagens envolvidos na investigação, fique atento às descrições de cenário. Então, todos esses elementos devem estar muito bem amarrados, de modo a prender a atenção do leitor, despertar a curiosidade e, principalmente, surpreendê-lo. Nada mais decepcionante do que tentar decifrar um crime e encontrar várias pontas soltas ou informações que não fazem sentido.
Já escolheu o seu? Então, lupa na mão, atenção aos mínimos detalhes e ao trabalho, detetives!
15 livros que tratam de mistério e histórias de detetive para desvendar agora!
Procura-se o Curupira, de Alexandre de Castro Gomes (Escarlate)
Quem matou o Saci?, de Alexandre de Castro Gomes (Escarlate)
Os Detetives do Prédio Azul - Casos Ecológicos, de Flávia Lins e Silva (Pequena Zahar)
Os Detetives do Prédio Azul - Aventuras culinárias, de Flávia Lins e Silva (Pequena Zahar)
Os Detetivos do Prédio Azul - Os mistérios de Mila, de Flávia Lins e Silva (Pequena Zahar)
Os Detetives do Prédio Azul - Primeiros casos, de Flávia Lins e Silva (Pequena Zahar)
Além do desafio, de Severino Rodrigues (Escarlate)
Cinco enigmas, um tesouro, de Caio Riter (Escarlate)
O Clube dos Caçadores de Códigos: O segredo da chave do Esqueleto, de Penny Warner (Escarlate)
O Clube dos Caçadores de Códigos: O mistério do tesouro do pirata, de Penny Warner (Escarlate)
A ilha do mistério, de Paul Adshead (Brinque-Book)
O mistério do colecionador, de Milton Célio de Oliveira Filho (Escarlate)
O caso do grande roubo do museu, de Milton Célio de Oliveira Filho (Brinque-Book)
Mortina e o primo insuportável, de Barbara Cantini (Companhia das Letrinhas)
Mortina e o amigo fantasma, de Barbara Cantini (Companhia das Letrinhas)
(Texto de Vanessa Lima)