Nenhum governante brasileiro permaneceu no poder por tanto tempo quanto Getúlio Vargas. Para traçar o seu perfil, Boris Fausto passa ao largo do maniqueísmo e dos estereótipos, do culto ao "pai dos pobres" e da denúncia do "caudilho". Ele parte das raízes familiares de Getúlio, bem como do ambiente político em que este se formou, no Rio Grande do Sul.
Nenhum governante brasileiro permaneceu no poder por tanto tempo quanto Getúlio Vargas. Para traçar o seu perfil, Boris Fausto passa ao largo do maniqueísmo e dos estereótipos, do culto ao "pai dos pobres" e da denúncia do "caudilho". Ele parte das raízes familiares de Getúlio, bem como do ambiente político em que este se formou, no Rio Grande do Sul.
Como pôde um caudilho, um estancieiro envolvido nas eternas querelas entre chimangos e maragatos, um gaúcho de botas, bombachas e chimarrão, um político eminentemente provinciano, ser o mais centralizador dos governantes brasileiros, combatendo duramente o regionalismo e erigindo o nacionalismo em ideologia? Como um ditador simpático ao fascismo se torna um líder de massas cultuado pela esquerda? Como esse homem dos campos e dos pampas presidiu o país durante a sua quadra histórica de industrialização mais acelerada?
É partindo de perguntas como essas que o historiador Boris Fausto conduz sua investigação sobre esse fenômeno chamado Getúlio Vargas - com respostas que passam ao largo dos velhos chavões e do maniqueísmo. O político astuto e dissimulado era, mais simplesmente, um homem reservado. Tinha crenças arraigadas, mas fez do pragmatismo um norte na sua atividade política. Entre o estereótipo do benfeitor dos "humildes" e o manipulador das grandes massas, Boris Fausto escolhe as duas alternativas. Seu perfil de Getúlio é uma obra de síntese, que contribui para a compreensão não só da trajetória do "pai dos pobres" como dos impasses da formação nacional.
Impasses que dizem respeito ao presente. Na seção final do livro, o autor inventaria e discute o legado da Era Vargas, debate que voltou à pauta no cinqüentenário da morte de Getúlio. A estrutura sindical corporativa, o salário mínimo e o esboço de criação de uma infra-estrutura industrial com a preservação da estrutura fundiária fazem parte desse legado.
Algumas das características de Getúlio ajudam a entender por que ele os criou, como a crença na intervenção estatal na economia, o autoritarismo, o paternalismo, a profunda oposição ao liberalismo. Mas há outras determinações que estavam, e estão, nas condições mesmas do país. É o caso das necessidades de construir uma base de apoio popular, de não afrontar os interesses dos fazendeiros e de manobrar entre as grandes potências e empresas estrangeiras para atrair capitais.
Boris Fausto tece lentamente todos esses fios, ligando o apogeu do poder de Getúlio ao seu passado, o seu modo de ser ao quadro histórico, a sua política aos limites impostos pela conjuntura e pelas condições estruturais do Brasil. O resultado é o painel de um político concreto, inclusive no perfil psicológico, e de sua época.