Avós e avôs trazem histórias de outros tempos, pessoas e lugares para o presente das crianças. Esse é um presentão que fica para sempre na memória. E alguns avôs e avós gostam tanto dessa “tarefa” de contar histórias que acabaram publicando-as em livros, para que muito mais crianças tenham acesso a elas. Como o Dia dos Avós (26 de julho) está chegando, o Blog perguntou a alguns desses avós-autores de hoje o que eles liam quando eram crianças.
Que leituras marcaram suas infâncias? Quais eram seus autores preferidos?
LEIA MAIS: Por que é importante brincar com os avós?
Ilustração do livro Histórias de avô e avó, de Arthur Nestrovski
Em homenagem a todos os vovôs e vovós, trazemos aqui as histórias de Graça Lima, Laurabeatriz, Marisa Lajolo, Lilia Schwarcz, Luiz Schwarcz, Sônia Rosa, Roseana Murray, Luiz Antonio Aguiar e Mário Prata, que relembram suas experiências quando eram pequenos leitores!
LEIA MAIS: Dez livros para ler com os avós!
“Aprendi a ler palavras, lendo imagens. Minha mãe era a melhor contadora, leitora e criadora de histórias e nos estimulava muito nesse sentido. Não havia essa quantidade enorme de livros dedicados à infância. Os livros eram caros e, apesar da dificuldade, meus pais compraram uma coleção, que era minha felicidade: O mundo da criança. Minha mãe lia para nós, e meu irmão, já alfabetizado, muitas vezes, também lia para mim. Eu adorava todos os volumes, creio que uns 15. Gostava do cheiro dos livros, da capa dura, de sentir o papel do miolo e mesmo o peso dos volumes, que eram acima do que eu conseguia transportar. O volume Poemas para a primeira infância me fascinava com suas ilustrações e fui criando as minhas histórias através daquelas imagens. Esse encantamento e curiosidade me levaram a decifrar as palavras.”
Graça Lima, autora de Dez patinhos e ilustradora de Vizinho, vizinha
“As primeiras histórias que eu conheci foi minha mãe que me contou. Chapeuzinho Vermelho, Barba Azul, a Moura Torta, Rapunzel, Dona Baratinha.
Antes de aprender a ler, meu livro preferido era, e ainda é até hoje, João Felpudo, de Heinrich Hoffmann.
Os primeiros livros que li foram Reinações de Narizinho e O Saci, de Monteiro Lobato. Depois conheci os contos de fadas, Andersen, Grimm, Perrault.
Adorei Alice no país das maravilhas, de Lewis Carroll.
Eu também gostava muito de ler a revista Tico-Tico!”
Laurabeatriz, autora de Brasileirinhos do Pantanal, Brasileirinhos da Amazônia, Zum-zum-zum e outros poemas e muitos outros
“Eu morava em Santos. Gostava muito de ler. Lia numa poltrona bem velha, com o forro saindo num dos braços. Eu ganhava, um a um, os livros de Monteiro Lobato e passei a morar no sítio da Dona Benta. O único mal era que lá não tinha praia... Hoje sei que Lobato passava férias em Santos e adorava banho de mar... No Picapau Amarelo, as jabuticabeiras me encantavam. Na verdade, eu nunca tinha visto (nem comido, claro!) jabuticaba. A ideia do tloque / plufe / nhoque de Narizinho chupando a jabuticaba (tloque!), cuspindo casca e caroço (plufe!) e Rabicó comendo os restos (nhoque!) me parecia uma festa! Mas também morei na África. A África do Tarzan. A mesma poltrona velha era às vezes o sítio e às vezes a floresta. Tenho dois irmãos caçulas - Paulinho e Flávio - e brincávamos de falar a língua de Tarzan: o sol era Kudu, a lua era Goro, a leoa era Sabor e o elefante era Tantor... Há alguns a anos, descobri que o autor das histórias de Tarzan nunca tinha saído de Chicago! Num sebo aqui de São Paulo, consegui achar a coleção que hoje - ao lado da de Lobato - mora no meu escritório.”
Marisa Lajolo, autora de Reinações de Monteiro Lobato
“Quando era criança o meu primeiro contato com as histórias foi através da oralidade, que é um dos valores civilizatórios afrobrasileiros. Minha mãe, baiana de nascimento, contava muitas histórias para mim, que havia ouvido quando era menina. Eram histórias populares, causos simples da vida do nosso povo, muitos deles contados de maneira melodiosa, em versos e em prosa. Bicho papão, lobisomem, mula sem cabeça, curupira, fadas e bruxas potencializavam minha imaginação. Eram assim os meus dias. Cheios de encantamentos. Fui crescendo e desenvolvi uma paixão pela palavra falada, dita em voz alta de maneira alegre, cadenciada, rimada. Quando me tornei mãe usei esta mesma receita com os meus filhos. E agora chegou a vez dos meus netinhos, a história continua... Estou feliz.”
Sônia Rosa, autora de Os tesouros de Monifa
“Não sei qual foi o primeiro Lobato que li, mas o mais importante, e o livro que é o mais importante na minha vida até hoje, é A chave do tamanho. Foi o livro que me pôs pra pensar eu-no-mundo, e, portanto, aquele que deu um clique-boot na minha inteligência: ligou! Acho que eu tinha em torno de 10 anos, na época. Ou menos. Desde pequeno adorava histórias em quadrinhos (trabalhei 12 anos na Disney, e hoje sou roteirista) e pequenas adaptações de clássicos. Tudo isso foi se acumulando, até que um dia quis entrar no mundo das estantes, pessoalmente, ou seja, virei escritor. Foi a imaginação via leitura que coloriu minha vida de infância e grande parte da adolescência. Vivi Literatura antes de viver a vida, e acho que foi legal assim, me fez desejar mais o mundo. Botei muito isso pra cima dos meus netos. Ler para eles, depois com eles e, hoje, dar livros a eles, recomendar um ou outro, faz parte de nossa afetividade, do nosso se gostar. Outros títulos, claro, uma literatura atual, mas sempre recheada de aventuras, de envolvimento, de me ver dentro das histórias. Foi e é assim.”
Luiz Antonio Aguiar, autor de Esopo: liberdade para as fábulas
“Na casa da minha avó havia uma cristaleira com a coleção do Tesouro da Juventude. Assim que pude ler, lia, no Tesouro, os contos de fada. Não podia levar os livros para casa. Na casa da minha melhor amiga, havia toda a coleção do Sitio do Picapau Amarelo. Todos os dias, depois da escola onde estudávamos juntas, ia para a sua casa ler. Também não podia levar os livros para casa. Os que mais amava, lia de novo e de novo. Dois livros me marcaram, além destes, quando era criança: A fada menina, não me lembro a autora, e Uma aventura na Pré-História, com um personagem menino. Eu podia reler os dois livros dezenas de vezes, a tal ponto que, 60 anos depois, ou um pouco mais, lembro completamente das histórias e do que sentia. E nunca mais parei de ler, nem um único dia.”
Roseana Murray, autora de Colo de avó e Suspiros de luz: haikais
“Eu lia muito com meus pais O pequeno príncipe, do Antoine de Saint-Exupéry. Em português e em francês. Sempre ficava muito emocionada (e curiosa) ao imaginar aquela criança isolada num planeta e cuidando da sua flor. Lembro de também ficar impressionada com o fato do Pequeno Príncipe morar do lado de fora do planeta. Tinha medo que tombasse de lá. Por fim, me recordo de meus pais me dizendo como era importante cuidar bem dos amigos e cultivá-los. Levo essa lição comigo. Sempre.”
Lilia Schwarcz, autora de O circo do amanhã, Reinações de Monteiro Lobato e Uma amizade (im)possível
“O livro que mais marcou minha infância foi Os meninos da rua Paulo, de Ferenc Molnár. É uma história de coragem e lealdade, na qual o menino mais novo do grupo, que sofria algum bullying, se torna herói. Me identifiquei muito por ter passado por momentos semelhantes na escola e numa colônia de férias. Também contou o fato de ter sido o único livro que meu pai me presenteou. Em geral, ganhava livros da minha mãe.”
Luiz Schwarcz, autor de Minha vida de goleiro e Em busca do Thesouro da Juventude
“A minha leitura na infância foi muito diferenciada porque, em casa, todo mundo lia muito. A minha irmã mais velha adorava ler a revista Contigo, que naquela época era uma revista para mulher e, da metade em diante, era fotonovela italiana. E eu adorava ler as fotonovelas, assim que eu comecei a ler, eu queria comprar Contigo por causa das fotonovelas. E de fotonovela, evidentemente, fui direto para o gibi. Eu pertenci a uma geração, dos anos 50, a minha infância, quando o gibi estava estourando no Brasil. Gibis americanos, evidentemente, né? Não só os para crianças, da Disney, que chegaram mais ou menos por aí, mas principalmente de bangue-bangue, Cavaleiro Negro, Zorro, de crimes e policiais.
E minha mãe também lia muito. Desde pequeno, eu não gostava das histórias infantis, achava que eram todas muito maldosas. Aquele negócio da mulher que fica engordando o garotinho, ver se os dedinhos estavam gordinhos para comer. Ou a própria Chapeuzinho Vermelho que tem mil conotações ali, né? Os três porquinhos, coitados. Minha mãe também não curtia contar essas histórias pra gente. Tanto é que, quando eu criei meus filhos, quando eles eram pequenos, eu comecei a inventar histórias para eles. O homem que soltava pum, por exemplo, eu ia contando e a cada dia ia aumentando, eu não sabia o fim daquilo. E acabei publicando.
E tinha também um personagem de um livro de aventura que chamava Xisto, que era meio um cavaleiro medieval, e eu li com uns 7 ou 8 anos.”
Mario Prata, autor de João do Pum
***
Leia mais: