Pelo simples prazer de jogar

27/05/2013

Ex-jogadora da liga universitária americana corre 25 países atrás da bola e das histórias anônimas que cercam as peladas.

Longe dos refletores e dos campos oficiais dos estádios, pulsa outro lado do futebol: os jogos espontâneos, feitos por e para qualquer um, em qualquer lugar. Gwendolyn Oxenham foi atrás desses jogos ao lado de seu namorado e mais dois amigos. Jogou com barqueiros em Santa Catarina, prisioneiros na Bolívia, garçons e porteiros no Rio de Janeiro, executivos no topo de arranha-céus no Japão, destiladores ilegais na mais antiga favela do Quênia. A aventura, que durou três anos, foi registrada inicialmente para o documentário Pelada e sai agora pela Zahar em livro homônimo. Em entrevista por email, a autora fala um pouco sobre futebol, o prazer de jogar e sua viagem pelo mundo.

Por que lançar o livro depois do filme? O que faltou ser dito?

O filme condensa três anos e 25 países em noventa minutos – o que significa uma enorme quantidade de cenas cortadas. O livro acompanha as nossas aventuras, aprofunda as histórias e oferece ao leitor um olhar por trás das cenas enquanto buscávamos os jogos. Muita coisa acontece longe das câmeras.

Anos atrás, você passou alguns meses jogando no time do Santos. Como foi a experiência? Você acha que há influência do futebol brasileiro em sua maneira de jogar?

Eu não falo nada de português e minhas companheiras de time não falavam nada de inglês, então era como um grande jogo de charadas. Eu apenas vestia as roupas que elas vestiam, sem ideia para onde íamos ou o que estávamos fazendo. Karen (companheira de quarto) falava comigo em português e eu falava com ela em inglês e nós fingíamos nos entender. Eu sequer conseguia pronunciar seu nome corretamente (não consigo desenrolar meu “r”). Então, sempre que eu tentava encontrá-la, ninguém tinha ideia do que eu queria. Minhas colegas de time e o treinador foram muito gentis comigo – e tentaram me ensinar a sambar, mesmo desencorajados com minha falta de ritmo. Eles também eram mais criativos do que eu, eram melhores na habilidade de improvisar em campo. E, como o estereótipo americano, eu era melhor nas corridas e na ginástica. Mas eu gosto de pensar que um pouco da ginga brasileira passou pra mim.

Durante a viagem para o filme, você passou mais tempo no Brasil e, consequentemente, escreveu mais páginas sobre nós. Por quê? Você concorda com o senso comum que diz que o Brasil é o “país do futebol”?

Sim. Apesar de termos encontrado peladas em todo lugar que fomos, acho que ainda é mais difundida no Brasil. E foi o país com o mais alto nível de habilidade – ambos os jogadores de sete e setenta anos com quem jogamos, por exemplo, foram incríveis. E no Brasil os jogadores têm uma alegria marcante – afeição pela beleza do futebol.

Você se arriscou para achar jogos na Palestina, no Irã e nas favelas de Buenos Aires e do Rio, por exemplo. Você acredita que o futebol pode unir estranhos mesmo diante das circunstâncias mais difíceis ou há limites? E você repetiria essas experiências se tivesse oportunidade?

Quando você joga, você deixa de ser americana ou mulher ou turista e se torna apenas outro jogador. Tem um entendimento mútuo de que vocês amam a mesma coisa... e eu acho isso poderoso. E, sim, eu passaria pelos mesmos riscos se eu tivesse chance, porque eu amo a oportunidade de conhecer pessoas que eu nunca conheceria se não soubesse como quicar a bola.

Dito isso, eu acho que o jogo tem os seus limites — em Jerusalém, por exemplo, um dia depois de um ataque terrorista, jogamos com árabes e judeus que se recusaram a jogar no mesmo time. Esse foi um caso em que o futebol não transcendeu tudo. No entanto, eles ainda estavam jogando em um campo juntos e eu não acho que isso seja irrelevante.

Em seu livro, muitas pessoas ao redor do mundo dizem que vivem para jogar futebol. Como é pra você?

Futebol me deu toda a minha vida. Quando comecei a jogar, jogava para fugir de tudo ao meu redor e eu não acho que isso algum dia tenha mudado. Adoro me perder no jogo.

Compartilhe:

Veja também

Voltar ao blog