Guilherme Karsten, um dos 10 indicados para representar o Brasil na Bienal de Bratislava, fala com o Blog da Brinque

19/06/2019
Guilherme Karsten, 36 anos, nasceu, cresceu e vive em Blumenau, Santa Catarina. Especializado em Design Gráfico e publicitário de formação, ele se dedica a ilustrar livros infantis desde 2010, quando ganhou um concurso de ilustração para novos ilustradores realizado pela Livraria da Vila. Desde lá, acumula livros e prêmios. Pela Brinque-Book, por exemplo, em parceria com Ilan Brenman, publicou Mãenhê! e Conversa para pai dormir. A parceria com Brenman deu origem a outras obras, por outras editoras, como o Agora (Sesi), finalista do Jabuti 2018 em ilustração. Sua obra solo Carona recebeu menção honrosa no Prêmio Internacional Serpa de Livro Ilustrado, de Portugal, em 2017. Ele é um dos 10 ilustradores brasileiros selecionados pela FNLIJ (Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil) para representar o Brasil na Bienal de Ilustração de Bratislava (BIB) 2019, na Eslovênia. Ele conversa com a gente, a seguir, sobre reconhecimento e prêmios, livros para crianças, ilustração, inspirações, referências, linguagens e como mergulhar na ilustração. O Blog da Brinque também conversou com o autor Fernando Vilela, outro indicado para a BIB. Vale a pena ler o bate-papo, publicado quinta passada nesse post. Blog da Brinque: Qual é a importância desse tipo de reconhecimento internacional para a ilustração e para o trabalho de vocês? Em quê esse tipo de evento e premiação contribui? Guilherme Karsten: É a primeira vez que participo deste evento; já ouvia sobre Bratislava [Bienal Internacional de Ilustração da Eslovênia] há anos, mas confesso que desconhecia a sua grandiosidade. Quando a FNLIJ [Fundação Nacional do Livro Infantil e Juvenil] revelou os 10 artistas escolhidos para representar o Brasil na feira, notei que o meio editorial ( literatura infantil) ficou em polvorosa. O processo de participação é diferente de outros concursos de ilustração, com um filtro maior dos artistas, uma surpresa feliz pra mim por esse reconhecimento do meu trabalho. Com certeza, pesa bastante no currículo ter seu nome entre os participantes deste evento. BB: Desse universo de ilustradores -- incluindo alguns que estarão com vocês na Bienal ou que já estiveram na Mostra de Ilustradores de Bolonha, como o Fernando Vilela já esteve --, quais são os que mais tocam a sensibilidade de vocês? Guilherme: Reconheço, primeiramente, que alguns dos que representam o Brasil comigo são meus heróis há anos, o que [torna] surreal, para mim, [a experiência de] estar no meio deles. Além destes, gosto muito da Beatrice Alemagna, JooHee Yoon, Jon Klassen, Chris Haughton e meus preferidos são os ilustradores portugueses: Andre Letria, Catarina Sobral, a editora Planeta Tangerina... a lista é grande. BB: O que você destaca de mais bacana no cenário internacional de ilustração que a gente que adora essa arte precisa conhecer, ficar de olho? Guilherme: Os artistas que citei na pergunta anterior são contemporâneos e movimentam o cenário editorial lá fora. E o que acontece ao redor do livro ilustrado, as informações que dão suporte aos profissionais interessados, como cursos/oficinas com artistas, sites especializados no assunto, podcasts que tiram duvidas recorrentes, todos estes ajudam muito a melhorar e padronizar ainda mais o mercado.

Tenho como um dogma a tentativa de fazer com que a minha ilustração não seja óbvia, mas que seja companheira do texto, que saiba contar a mesma história de outra forma ou até mesmo contar outra história

  BB: O que é ilustrar, hoje? Guilherme: Difícil pergunta, não sei se é hoje, mas tenho como um dogma a tentativa de fazer com que a minha ilustração não seja óbvia, mas que seja companheira do texto, que saiba contar a mesma história de outra forma ou até mesmo contar outra história, mas que corrobore e não atrapalhe. Uma boa ilustração te instiga a novas perspectivas, te faz imaginar além do que está sendo visto ou lido. BB: Você pode comentar um pouco sobre seus processos de criação e inspiração? O que inspira você? Como cria? Como essas inspirações ganham corpo? O que tem mexido com você - em termos de inspiração, arte, técnica, processos, materiais no momento no trabalho de você? Guilherme: Normalmente após ler o texto e entender a história, eu decido de que forma vou trabalhar, digitalmente ou manual (normalmente vou pro computador pois é mais confortável para mim). É hora de deixar a imaginação fluir e a imaginação pode vir de qualquer lugar, numa conversa, numa caminhada, numa refeição... é preciso estar atento. Sempre pesquiso algumas referências de imagens, filmes, músicas, etc., então começo a rabiscar algumas ideias. Confesso que sou um tanto apressado e impaciente, deveria pesquisar mais antes de iniciar os layouts. Agora, quando o livro foi escrito por mim, o processo é muito mais difícil, demoro  pra começar a rabiscar. Me sinto meio felino, dou voltas e voltas ao redor do texto, sondo o local, fico ressabiado, até que decido enfrentar, é ruim mas é bom, ou bom mas ruim. BB: Você tem hábitos ou manias na hora de criar ou pensar um trabalho? Guilherme: Uma mania que tenho é de não fazer os layouts para apresentar para o editor. Gosto de iniciar a arte e já finalizar. Mas, como os editores pedem, faço um layout de forma muito sofrível (ao menos para mim) e sempre tenho a impressão de que irão recusar, mas normalmente entendem a ideia :) BB: Você pode contar assim, de bate-pronto, o nome de um livro, de um filme, de uma música, de uma peça de teatro, de um programa de TV e de uma performance (dança, canto, arte de rua...) que tenha mexido com você recentemente? Tudo bem se não tiver um exemplo pra cada, mas a ideia é que seja a primeira que vier à memória. Guilherme: De todas estas artes citadas na pergunta, a que mais mexe comigo, e que mexe comigo profundamente, é a música, muito mais do que cinema, teatro ou mesmo que livros. E gosto de todos os tipo, desde a MPB ao Rock; canto alto, sorrio, choro... injusto citar uma apenas. Mas vou citar um filme antigo que me pegou de jeito: O Brilho Eterno de uma Mente Sem Lembranças. E um livro que comprei dias atrás e, como artista visual, comprei combinação capa+ título fortes: O som e a fúria, de William Faulkner, a mais recente edição da Cia. das Letras. Estou na metade do livro, e o jeito como foi escrito é muito interessante. Na próxima entrevista, direi se gostei ou não.

Um bom livro ilustrado é aquele onde a gentileza reina, há momentos em que a imagem dá a vez à palavra e há momentos onde a palavra reconhece a imagem como o protagonista

  BB: O livro ilustrado vem ganhando cada vez mais apaixonados e mais prestígio também. É, em geral, um livro infanto-juvenil, mas que não agrada apenas aos pequenos. Queria pedir que você comentasse essa relação palavra-imagem, a profundidade de camadas e belezas e como uma conversa entre as duas linguagens enriquece a experiência estética do leitor de todas as idades. Guilherme: Imagens e palavras precisam ser amigas. Um bom livro ilustrado é aquele onde a gentileza reina, há momentos em que a imagem dá a vez à palavra e há momentos onde a palavra reconhece a imagem como o protagonista. E esta conversa precisa ser mediada por um bom design que cria um espaço para ambas, as páginas precisam respirar. E como falei anteriormente, imagem e palavra se completam, não podem ser redundantes, senão o livro torna-se enfadonho. BB: Falando nisso, uma imagem vale mais que mil palavras? Mil palavras deixariam essa entrevista muito longa, resolvi usar uma imagem pra representar ;) BB: Para quem está começando agorinha a mergulhar nesse universo do livro-imagem e da ilustração, o que você recomenda? O que pode ser um bom mapa, ponto de partida, ponto de chegada, guia, amigo de viagem, meio de libertação etc?  Guilherme: Muitos livros são lançados todos os dias, é muito difícil saber de tudo o que acontece, o que é ruim e o que pode ser considerado boa literatura Um bom começo é procurar por reviews de livros, blogs e canais de Youtube de contação de histórias, geralmente os conteúdos revisados são bons, desde lançamentos a clássicos. De qualquer forma, livros são bons amigos de jornada, ótimos companheiros. Qualquer ponto de partida de um bom livro é ler e ver o que aparecer a sua frente, o bom gosto vai aparecendo à medida que você degusta novas histórias.
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